Navegando por Autor "ITALIANO, Matheus Pangracio"

Discorrendo o ABC: corazonando o amor na doutrina de Mestre Irineu
(Universidade Metodista de São Paulo, 2025-08-21) ITALIANO, Matheus Pangracio; RODRIGUES, Airton
Pode a academia, com sua razão instrumental, verdadeiramente compreender o que é o Amor? Este trabalho parte da premissa de que para acessar saberes de tradições não-hegemônicas, são necessários métodos que também desafiem a lógica colonial. A pesquisa se volta para a doutrina de Mestre Irineu, também conhecida como Daime ou Santo Daime, que integra o uso da Ayahuasca, bebida utilizada pelos povos ameríndios, dentro de um contexto religioso e cultural específico. A doutrina foi fundada por Raimundo Irineu Serra, conhecido como Mestre Irineu, no início do séc. XX e caracteriza-se por uma nova tradição religiosa que possui fundamentos cristãos unidos com práticas tradicionais dos povos originários e da cultura popular. Um dos elementos principais são os hinários, uma série de hinos cantados em grupo nos rituais. O hinário "O Cruzeiro" de Mestre Irineu e os hinários de seus companheiros, que formam o corpo doutrinário, são considerados como as escrituras sagradas da Doutrina. O estudo se propõe a responder à pergunta: "o que é o Amor na Doutrina do Mestre Irineu?", uma vez que existem poucas pesquisas no campo das ciências da religião que estudem a doutrina do Mestre Irineu. Ademais, essa investigação é relevante pois apresenta o contexto histórico e sociocultural, além dos elementos de uma nova religião que precisou vencer a resistência cultural para se estabelecer. Para tanto, são utilizado relatos históricos e etnográficos sobre a vida de Mestre Irineu e análises contemporâneas sobre a sua Doutrina. A pesquisa, de natureza qualitativa e documental, emprega o método-sabedoria corazonar, sistematizado por Patricio Guerreiro Arias, em conjunto com a metodologia da cartografia corazonada, conforme as perspectivas de Rolnik (1989) e Faria (2017), para mapear o conceito, estruturando a análise pelos quatro eixos da Chakana Andina (Yachay, Munay, Ruray e Ushay). Estes métodos colocam as sabedorias insurgentes, os conhecimentos de povos e culturas que foram e são marginalizadas, em igualdade aos conhecimentos hegemônicos, que são aqueles impostos pela colonização, buscando apresentá-las a partir de suas próprias perspectivas e contextos. A análise revela que o Amor não é um sentimento único, mas uma complexa arquitetura espiritual. É o próprio saber (Yachay) que dá acesso à Verdade; é o querer (Munay) que edifica a comunidade em oposição ao mundo da "ilusão"; é um método-sabedoria prático (Ruray) que opera através da dialética entre a miração (revelação) e a peia (correção), exigindo disciplina e firmeza; e, finalmente, é o poder-fazer (Ushay) que se materializa na missão de curar a Terra, a vida e a humanidade. O estudo contribui para o debate acadêmico decolonial e para a decolonização de cada sujeito nas esferas do saber, ao demonstrar como as práticas espirituais insurgentes apresentam perspectivas e soluções outras para os desafios individuais e coletivos, como também na esfera da decolonização ser, ao demostrar a possibilidade de o amor ser a força e a estrutura que dá valor para a existência e mantém um horizonte de vida. Em última análise, o estudo sugere futuras pesquisas e aponta que a Doutrina do Mestre Irineu é um movimento cultural que apresenta uma visão de mundo integrada com a natureza, tendo o Amor como força motriz, assim desafiando as dicotomias impostas pela modernidade ocidental e oferecendo outras formas de ser, saber e existir.